A violência contra a mulher não ocorre esporadicamente como muitos dizem. Segundo o Centro de Referência Estadual da Igualdade (CREI) de Goiânia, cerca de cinco mil mulheres são espancadas a cada dois minutos no
Brasil.

Para Wilmeia Rocha, assistente social do CREI, a violência é considerada todo tipo de agressão, uma ação danosa à vida e à saúde. Com a lei Maria da Penha, instituída em 7 de agosto de 2006, instituiu os tipos de violência. Antes de chegar à física, a mulher passa por três processos de violência, a psicológica, matrimonial e moral.

Ainda de acordo com Wilmeia, a violência passa por um ciclo: "o companheiro da mulher chega nervoso em casa e acaba agredindo-a, depois ele fala que se arrepende e a convence de tentar o relacionamento novamente, é nesse momento que ela volta, e depois acontece tudo novamente. Quando a mulher o denuncia, na verdade não quer se vir livre dele e sim livre da violência, querendo que aquele homem seja transformado, que ele mude a conduta dele", afirma.


Segundo Rocha, a mulher deve procurar ajuda profissional, como a Secretaria da Mulher, tanto Municipal quanto estadual, ajuda psicológica, social, jurídica e a Delegacia Especializada da Mulher (DEAM) que faz os atendimentos. "Nós orientamos que a cada agressão que a mulher sofrer, ela deve fazer o boletim de ocorrência (BO), pois vai somando pontos a favor dela. No caso da mulher solicitar a medida protetiva e o agressor violar essa medida, ele irá ser punido, pois estará descumprindo a ordem do juiz, explica.


Para Geovanna Marques, que por várias vezes sofreu agressões pelo ex marido, relata que a primeira vez em que foi agredida, estavam namorando, "eu me lembro que fui para a casa dele e havíamos entrado no quarto, quando ele me perguntou sobre os ex-namorados e ficou furioso por ainda existir uma conversa no meu celular com um deles. Extremamente agressivo, me empurrou e comecei a chorar, pedindo para ir embora, mas ele não deixou, ele me pediu perdão chorando e eu o perdoei". A segunda vez que ocorreu a agressão foi quando estavam casados, "um dia saímos para a casa de um amigo nosso, ele havia bebido muito e deu em cima de uma amiga na minha frente. Foi quando eu briguei com ele e imediatamente partiu para cima de mim, batendo minha cabeça na parede. Chamaram a polícia pela sua gritaria e por dar socos nos carros, a polícia veio, mas não o levaram, pois não tive coragem de falar sobre a agressão". Ao perguntar por que ela continuou com ele mesmo sabendo que ele era agressivo, ela responde que: "Eu me sentia triste, mas não tinha coragem de largá-lo, pois eu o amava".

O CEVAM (Centro de Valorização da Mulher), uma ONG constituída há mais de 35 anos, tendo como líder a advogada e escritora feminista Consuelo Nasser. O foco da ONG é combater a violência contra crianças, mulheres e adolescentes. O CEVAM não recebe ajuda do governo e vive com o que a comunidade oferece. O principal programa que dá visibilidade ao CEVAM é o abrigamento.


Segundo Maria Cecília, que está há 16 anos no CEVAM e atualmente trabalha como voluntária, a violência doméstica se dá na rua, filhos de pais violentos são futuros agressores, o que é vivenciado em casa será praticado na rua. Hoje o CEVAM trabalha com dois abrigamentos, o abrigo de mulheres em situação de violência com os seus filhos, que está dentro da lei Maria da Penha. No modo de ver de Maria, o trabalho com meninas é o pior, porque é o estupro familiar. A ONG tem meninas adolescentes e crianças vítimas de violência dentro do seu próprio lar. Ela explica como o CEVAM enfrenta para atender as vítimas.

"As vítimas já chegam deterioradas, com baixa estima, muitas vezes quem vem trazê-las, que são os policiais, já acabam com a moral da mulher. Dizendo para elas voltarem para seu marido, pois é melhor ficar com ele do que sem ele, ou elas deviam ter feito alguma coisa para merecer isso. A maioria das pessoas quer jogar o peso da violência doméstica em cima das mulheres, dizendo que elas são as causadoras, principalmente em casos de estupro. As meninas passam a ser réu, elas começam a achar que são culpadas pelo o que aconteceu. Então nós enfrentamos, além do problema de funcionários, o problema financeiro, e o problema de colaborar com essas mulheres, que às vezes nós ajudamos com medidas protetivas, porém voltam para seus agressores", explica.

Para ela, a violência tem aumentado a cada dia. "Nós não sabemos se a mulher está mais corajosa ou se a mulher está sofrendo mais. Mais corajosa pela lei, que está fazendo seu papel de proteção ou se a mulher está procurando uma forma de sair desse ciclo, pois este ciclo é muito violento, ele começa com palavras, empurrões e a leva a morte".


Maria conta relatos bárbaros de mulheres que chegaram à ONG. "É muito difícil você ouvir que o agressor em um momento de raiva pegou o revolver e a matou. Ele vai martirizando aquela mulher até consumir o ato. Já vimos casos de mulheres que chegaram aqui com a cabeça raspada e sem cílios, queimadas de cigarro pelo corpo, em que ele todos os dias a queimava. Há oito meses, chegou uma mulher com os dois seios cortados pelo marido, com a faca que serra pão e deu para o cachorro comer. Eles fazem isso por maldade, tem aquele ditado, ‘se não fica comigo, não fica com mais ninguém’. Ao número elevado de mulheres que cometem suicídio após as agressões".

Ao perguntar o que deve ser feito para combater a violência doméstica, Maria Cecília responde. "Primeiramente temos que buscar políticas públicas, como uma forma de fortalecer as mulheres, de nos fortalecer, mostrar que somos poderosas, que nós sabemos nos defender, mas não é de defender, bater e levar, é de irmos à luta. Um trabalho que deveria estar começando através da mídia, dos nossos governantes, é a prevenção. Começar de pequenininho, mostrar para ele, os valores que se perderam no caminhar do tempo. Temos que fortalecer essas crianças e jovens, para que as mulheres não sofram violência doméstica’’, afirma à voluntária.

Sandra Maria, psicóloga que atende mulheres vítimas de violência doméstica do CREI, diz que a violência tem se tornado silenciosa, pelo fato de não ser falada e nem demonstrada. Um dos principais fatores de agressão são as drogas, bebidas e o desemprego. Ao ser perguntado o porquê as mulheres, após a denúncia, voltam com os seus companheiros, ela responde: "A grande maioria, no senso comum, pensa que as mulheres voltam com seus parceiros, porque gostam de apanhar ou porque são sem vergonha, as falas são muito em cima disso. Só que percebemos que são mulheres muitos amedrontadas, com medo das ameaças feitas por ele, de matá-la, ou fazer algo com seus filhos, com alguém da sua família, medo de não dar conta de sustentar seus filhos sozinhas. Então, às vezes, ela sustenta aquela relação abusiva por medo de sofrer uma causa maior’’.


Outra questão que a psicóloga aponta é a questão da dependência emocional. "Tem mulheres que amam demais os seus companheiros e que acreditam na mudança neles. A característica deste homem é um homem altamente sedutor, é um homem que para todo mundo é uma boa pessoa, um bom pai, um bom marido. Uma pessoa que no seu trabalho é responsável, seria impossível que ele cometesse este tipo de violência contra a esposa’’, afirma a psicóloga.

O centro de Referência Estadual da Igualdade CREI, organiza o projeto Grupo Reflexivo, de gênero para autores de violência doméstica, em parceria com o Conselho Tribunal de Justiça e a PUC – GO. O objetivo do projeto é evitar a reincidência, romper a cultura de aprisionamento e refletir sobre o ato cometido. Este projeto é determinado pelo juiz em fazer com que o agressor afaste do lar sem manter contato, o fazendo participar do grupo reflexivo de gênero.


Goiás é o terceiro estado a fazer o projeto do grupo reflexivo, e já está na terceira etapa. Este ano começou no dia 5 de abril e vai até o dia 12 de julho. Segundo o advogado José Geraldo, trabalha na parte jurídica do CREI, é um dos organizadores do projeto, diz que o projeto apresenta palestras psicológicas para os autores de agressão, com temas sobre Violência, Relacionamento entre Homem e Mulher, Cultura Machista e Legislação Maria da Penha.


De acordo com José, o projeto é determinado pela lei Maria da Penha, sendo obrigatório. Nele cabe o estudo e a reeducação, fazendo com que eles reflitam e vejam que estão errados. "Ninguém voltou a cometer agressão depois que passou pelo projeto", afirma o advogado. É importante ressaltar que violência contra a mulher é crime, ligue e denuncie qualquer tipo de agressão por meio do telefone 180.


Reportagem: Raquel Lima

Fonte de imagem: diariodoestadogo.com.br