O seu marido te ajuda? E tem pergunta mais irritante e torta do que essa? Ora, por favor… Antes de mais nada: o verbo empregado aí, em 2015, me soa inadmissível, ao menos ideologicamente falando… Sei que há mais coisas entre o céu e a terra do que sonho eu, e sei que existem milhões de realidades - e felicidades - por aí, mas, na concepção de família que vemos hoje em dia, esse verbo não cabe. Não, ele não me ajuda. Ele faz. Vamos começar do começo: ele pega no berço, troca a fralda, dá mamadeira, dá frutinha, escova o dente, troca de roupa, faz gracinha, dá um brinquedo, e aí o outro acorda, ele leva pra fazer xixi, escovar dente, tomar café, e aí o neném quer colo, e ele pega, e acaba o café e vai brincar de Transformers, e vai desenhar o Batman, e o neném fez cocô, e ele vai trocar a fralda… igual qualquer pai por aí… não? E ele tem que trabalhar? Sim, e a mamãe também… E lá vamos nós revezando, na proporção que é possível, dia após dia…

Na semana passada ele mesmo me contou, também surpreso, a forma com que foi abordado por um conhecido no caminho entre a casa e a natação do menino: "Sobrou pra você?", quis saber o colega. Duas coisas ficam evidentes aí: a primeira é a ideia do cara, ainda que inconsciente, de que levar o filho pra nadar (ou pra qualquer outra atividade) seja sobra, no pior sentido de sobra. E a outra é o fato de ele entender que, necessariamente, isso é tarefa de outra pessoa. A outra pessoa não pode cumprir sua obrigação, e aí sobrou pro pai, coitado…

O que me incomoda não são, obviamente, os múltiplos arranjos que cada família precisa fazer em função de suas obrigações de trabalho, dentre outras coisas. É claro que quem trabalha mais troca menos fralda, disso não tem dúvida… O que eu acho grave é o entendimento muitas vezes geral de que o pai, quando se trata do cuidado com os próprios filhos, presta favores à mãe, seja ela sua esposa ou não, e ajuda quando pode. A coisa é tão forte que atinge até mesmo quem, supostamente, tem a cabeça atenta a essas coisas e busca uma rotina diferente… Ou alguém acredita que eu - e tantas mulheres como eu - nunca fui traída pelo meu inconsciente e acabei repetindo frases como "até que eu não posso reclamar…"?

Levantar a bandeirinha da igualdade de obrigações e responsabilidades não vai mudar o mundo, eu sei, mas ajuda a plantar sementes. Tomar cuidado com o machismo velado é importante tanto para sofrer menos as consequências dele quanto para aumentar a chance de criarmos gerações mais justas. Ou existe escola melhor do que ver o pai dar papinha pro neném?

Fonte: Equilibrosa