Diante dos pequenos, repousam silenciosos estranhos objetos. Belos na forma, feitos de madeira, metal e outros materiais, agradáveis ao toque e reluzentes ao olhar. Pouco a pouco, as crianças vencem a distância, sentem as texturas, escolhem, pegam, exploram. Qual não é a surpresa geral ao perceber que aquelas coisas produzem sons,tão distintos quanto a fala ou um ruído estridente. Desde a Grécia antiga, 2,5 mil anos antes de Cristo, a música é utilizada na Educação com o propósito de cultuar a harmonia do indivíduo.

Hoje, sabe-se que o ensino musical é fundamental para o bom desenvolvimento dos pequenos. Elvira Drummond, professora de piano e literatura infantil, explica que a música é uma das poucas atividades que mexem simultaneamente com os dois hemisférios do cérebro (o esquerdo é mais ligado à criatividade, à língua e às artes, e o direito, às ciências exatas). Ao propiciar esse estímulo bilateral, ela amplia as vias neurais. Pesquisas mostram que existe uma espécie de ponte ligando os hemisférios e ela é mais espessa nos músicos."Em outras palavras, é muito bom ter uma prática musical diária", diz Elvira (leia mais no quadro).

Sons e concentração

Na Escolinha Meu Cantinho, em Fortaleza, a professora Joana Angélica da Costa promove uma série de atividades com as crianças de até 3 anos.Para começar, a sugestão do início desta reportagem: simplesmente levar para a sala instrumentos musicais e deixá-los à disposição de todos. Para os bem pequenos (em média, a partir dos 8 meses uma criança já consegue tocar), ela introduz experiências musicais que favorecem o desenvolvimento de habilidades perceptivas e sonoras, como imitar vozes de outras pessoas (pode ser o pai ou a mãe) ou sons de animais.

A professora, que também é cantora, atriz e arte educadora, costuma usar um CD de histórias para pedir que a turma produza sons partindo de conceitos simples, como grave e agudo. Depois, divididos em grupos, todos ficam prontos com seus instrumentos, esperando o sinal para tocar. "Com isso, eles aprendem noções básicas de regência e trabalhamos uma coisa fundamental, que é a concentração", diz Joana.Após apresentar os instrumentos, ela começa a distinguir a família do sopro, das cordas, da percussão e leva brinquedos percussivos, como tambor, xilofone, flauta e corneta, para a garotada se esbaldar.No fim, faz um ditado diferente: uns tocam e os outros, de costas, identificam pelo ouvido a família correspondente. Para essa atividade, miniaturas de instrumentos ajudam.

Paula Zurawski, formadora do Instituto Avisa Lá, assessora pedagógica das temporadas de teatro infantil do Teatro Alfa e professora do curso de Pedagogia do Instituto de Educação Superior Vera Cruz, em São Paulo, ressalta que a música é uma linguagem importantíssima para as crianças. "Os sons são, desde muito cedo, uma forma de interação com o mundo, tanto que as primeiras comunicações do bebê são melodias, as 'lalações'." Ambientes com adultos sensíveis a isso representam uma vantagem didática (por isso, saber cantar e ter cultura musical são competências importantes para o educador). Segundo Paula, nosso país tem uma longa tradição nessa área, o que facilita o trabalho."Basta ampliar o repertório e pensar, de forma crítica, no que se vai oferecer em sala."A riqueza dos sons no Brasil, no entanto, não é sinônimo de barrar canções estrangeiras - até porque elas têm muito espaço na TV e no rádio."O bom é ouvir tudo, de música clássica a rock", exemplifica.

Selma Petroni, coordenadora e professora do Centro Musical RMF, em São Paulo, diz que a música é também um elo entre a mãe e o bebê.Por isso, as aulas para crianças de 8 meses a 2 anos são acompanhadas pelas mães - que ajudam na socialização dos pequenos, que estão só começando a ter contato com outras pessoas e em alguns casos estranham isso.Como nessa faixa etária é difícil manter a concentração, o ideal é trabalhar durante meia hora - no máximo uma hora por semana.

As professoras ensinam a usar a música para ajudar no desenvolvimento infantil. O trabalho estimula trocas, com muitas histórias e canções que têm o nome das crianças na letra. Selma cita pesquisas que comprovam o efeito calmante do som: "A música tem uma pulsação, que elas ouvem desde quando ainda estão na barriga". Outro grande ganho é que, ao treinar o ouvido, fica mais fácil discriminar sons: de animais, dos instrumentos musicais etc. "Nosso papel é estimular o gosto pela música e aumentar a familiaridade com essa linguagem."

Fonte: Nova Escola