Por Ofélia Fonseca

Quando recebemos o diagnóstico de autismo do nosso filho, aos 2 anos e 3 meses, a recomendação dos médicos e terapeutas foi unânime: matricular o Tom na escola o quanto antes. A socialização no ambiente escolar seria tão importante quanto as terapias para o desenvolvimento dele. Naquele momento, mal poderíamos imaginar que ali começaria uma peregrinação que seria mais difícil ainda de enfrentar do que o próprio autismo.

Foram cinco escolas até que uma aceitou fazer a matrícula. Nem sei como explica o quanto era frustrante e triste para nós. Aceitaram o Tom, mas com uma série de restrições. Não poderíamos ter uma acompanhante terapêutica, fundamental no caso dele. Descobrimos em pouco tempo que nosso filho ficava peregrinando pelo pátio da escola sem o engajamento necessário ou atendimento especializado. O material visual desenvolvido pela nossa terapeuta para ajudá-lo a entender a rotina escolar ficava guardado no armário, sem uso. Decidimos buscar outra escola. Em menos de um ano, nosso filho já teria que experimentar uma mudança escolar, o que já é difícil para qualquer criança, o que dizer para um autista.

Depois de muita pesquisa e indicações, conseguimos uma vaga. Na nova escola fomos recebidos muito bem pela direção, que foi honesta: não tinham experiência nem estavam preparados para receber o Tom. E lidar com uma situação como essa causou imenso medo nos profissionais, que chegaram a tentar nos convencer a buscar outra escola, mais adequada. Mas que escola estaria preparada? Naquela altura, já sabíamos que nenhuma. E nossa opção foi por ficar. E fizemos um pacto com a escola que faríamos o processo de inclusão juntos. Professores, família e terapeutas. Não esperávamos que tudo partisse deles. Afinal, nós também não havíamos nascido preparados para ser pais de autista. Isso se aprende. Fazendo, estudando, buscando informação.

O que foi diferente nessa escola? Os profissionais e diretores apenas abriram a cabeça e seus corações para entender que ali havia uma oportunidade de crescimento e desenvolvimento para todos. Não apenas para o Tom. E lá se vão três anos de muitos debates, tentativas e erros e acertos, para criarmos a tal inclusão que é garantida por lei, é desejada por muitos, mas tão pouco de fato vivenciada. Hoje, aos 6 anos, o Tom está totalmente adaptado à escola. Os colegas, funcionários e outros pais recebem nosso filho como mais um, como igual. Tenho certeza de que não foi só a escola que fez bem ao Tom, ele também transformou a todos que convivem com ele. E hoje tenho certeza de que essa nossa experiência poderia acontecer em qualquer escola. É uma questão de querer. E tenho certeza de que o papel da escola é justamente esse: ser um agente transformador da sociedade, a partir das crianças.

Neste dia 2 de abril, Dia Mundial da Conscientização do Autismo, tudo o que eu desejo é isso. Que a gente comece a mudar o mundo e a ensinar nossos filhos a conviver com a diferença a partir da escola.

Fonte:Estadão