Por Graça Gouvêa

Na Gestalt-terapia o homem é visto como potencialmente saudável. Assim sendo, aquilo que se entende usualmente por mecanismos de defesa neuróticos, o gestalt-terapeuta compreende como formas de evitação do contato. E isto não significa apenas uma mudança de nomenclatura. A evitação de contato pode ser saudável ou patológica, conforme ¨ sua intensidade, sua maleabilidade, o momento em que intervêm e, de uma maneira mais geral, sua oportunidade.¨ (GINGER, GINGER, 1995).

A ação do gestalt-terapeuta não deve objetivar atacar, vencer ou superar as resistências quando o cliente está evitando o contato, mas, principalmente, torná-las mais conscientes ou figurais, favorecendo seu uso adaptado à situação do momento.

Um mecanismo de defesa por si só não é bom nem ruim. O uso que o cliente faz dele, o seu funcionamento, é o que caracteriza sua "patologia".

Os mecanismos mais citados pelos diferentes autores da Gestalt-terapia são:

Confluência (Perls) - É um estado de não-contato, por fusão ou ausência de fronteira de contato. O self (si mesmo) não pode ser identificado, ausência de discriminação eu/meio.

Introjeção (Perls) - Significa a incorporação de elementos do meio, de ideias a sentimentos, relações, valores etc. Não confundir com o conceito de introjeção da Psicanálise, pois no conceito de Perls há a implicação de um elemento que não foi assimilado. Outros autores de GT (Ginger) referem que a introjeção só é patológica quando não permite a assimilação.

Projeção (Perls) - Significa atribuir ao meio elementos fantasiados pelo próprio indivíduo. Para Perls, há aqui um deslocamento da responsabilidade do indivíduo para o meio. A projeção não patológica é o que permite, por exemplo, a empatia entre os indivíduos.

Retroflexão (Perls) - Consiste em voltar para si mesmo a energia mobilizada, fazer a si aquilo que gostaria de fazer aos outros ou que os outros lhe fizessem. São exemplos de retroflexão (tanto patológica como saudável): morder os dentes ou cerrar os punhos para não agredir; a masturbação; o sadismo e o masoquismo; a fala mental etc.

Deflexão (Polster) - Permite evitar o contato direto, desviando a energia de seu objeto primitivo.São exemplos: desviar o olhar; "falar sobre"; usar termos técnicos etc.
Proflexão (Sylvia Croker) - Uma combinação de projeção e retroflexão, consiste em fazer ao outro aquilo que gostaríamos que o outro nos fizesse.

Egotismo (Goodman) - Consiste em um reforço deliberado nas fronteiras de contato, devido a um reinvestimento de energia no ego, uma hipertrofia narcísica; geralmente é uma etapa do processo terapêutico, mas enquanto um estado crônico se torna uma patologia.

Em resumo, quanto a etiologia das neuroses do ponto de vista da Gestalt-terapia:


para Perls: com o acúmulo de necessidades interrompidas ou Gestalten inacabadas, o organismo se repete na busca de completar o que está inacabado ou interrompido, a fim de fechar a Gestalt;
para Paul Goodman: o self estaria vivendo uma interrupção na capacidade de promover o ajustamento criativo do organismo ao ambiente de forma atualizada. - Existiram três funções no self: função id (necessidades corporais); função eu (escolha ativa, funções de contato); função personalidade (autoimagem). Um sintoma sintetiza a resolução mais criativa que o organismo pode alcançar naquele momento entre estes diferentes níveis de funcionamento.

A Gestalt-terapia compreende que a consciência é um evento focalizado no presente, no aqui-e-agora, isto significa que: para perceber melhor um fenômeno dentro ou fora de mim mesmo, devo estar concentrado em minhas funções de contato. Este fluxo de consciência é conceituado em Gestalt-terapia como "awareness". Quando tal fluxo é interrompido significa que a consciência deixou de focalizar sua percepção sensorial para focalizar também uma fantasia. Tais fantasias são a base dos mecanismos de evitação, que podem ter um funcionamento patológico.

A Psicanálise baseia sua compreensão dos fenômenos psíquicos no estudo psicodinâmico destas fantasias, enquanto a Gestalt-terapia baseia sua compreensão no estudo do processo de focalização da consciência, devendo portanto abarcar a compreensão das fantasias, mas do ponto de vista do processo e não da fantasia isoladamente.

Toda resistência ou defesa é construída através de uma determinada fantasia, mas nem toda fantasia implica em resistência ou defesa.

A patologia implica não somente em evitação do contato, mas a qualidade e a funcionalidade desta evitação. Se através de uma dada percepção sensorial vem a minha consciência fantasias e imagens, o contato que estabeleço com estas pode ser extremamente criativo, e pode servir a elaboração e assimilação de algo que foi percebido anteriormente.

No jogo entre fantasia e percepção constrói-se o sentido da experiência vivida, quanto mais a fantasia antecipa este sentido, tanto menos a percepção se dá com o fenômeno no presente e sim com as imagens e construções mentais sobre a experiência, bloqueando assim a possibilidade de mudança.

O pensamento e a possibilidade de antecipar e planejar podem ser muito funcionais quando organizamos a contabilidade ou planejamos uma aula, mas se nos impedem de modificar, surpreender e criar, então estão a serviço de nossas fantasias neuróticas.

O psicoterapeuta deve combinar de forma "suficientemente boa" percepção no presente e antecipação cuidadosa, planejamento e surpresa, para ser um instrumento de mudanças criativas possibilitando ao cliente a percepção de novas "gestalten".

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

[1]: GINGER, S E GINGER, A.- GESTALT- UMA TERAPIA DO CONTATO , São Paulo: Summus, 1995.

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Fonte: Gestalt em Figuras