Ele não é um assassino em série, tampouco já ficou preso em uma cadeia psiquiátrica. Mesmo assim, seu chefe — ou seu vizinho, quem sabe — pode ser um psicopata. Diferentemente do que mostram os filmes, psicopatia, nas atuais classificações médicas, se refere a transtornos de personalidade, distúrbios psíquicos capazes de causar sofrimento ao indivíduo e a quem está a seu redor.
Pessoas com comportamentos desse tipo podem estar no ambiente de trabalho, no bar, na escola ou até dentro de casa. Saber conviver com elas é importante para se proteger nas relações, como ensina a psiquiatra Katia Mecler no livro "Psicopatas do cotidiano" (Casa da Palavra).
Na obra, a especialista lista os dez transtornos mais frequentes. Quem sofre de qualquer um desses problemas passa a impressão de que algo está fora da ordem: são pessoas que manipulam, seduzem, desconfiam demais ou são excessivamente carentes, por exemplo. Além disso, guardam em comum a relutância em admitir a necessidade de tratamento e a responsabilidade por um mal-estar no convívio interpessoal: para elas, o inferno são sempre os outros.
Com o jeito de ser inflexível, os "psicopatas do cotidiano" injetam sentimento de culpa, impotência e inadequação naqueles que estão no seu entorno — explica Katia Mecler, que também é coordenadora do Departamento de Ética e Psiquiatria Legal da Associação Brasileira de Psiquiatria.
OS DEZ TIPOS E SUAS CARACTERÍSTICAS
1. Esquizoide
– Prefere atividades solitárias
– Não deseja nem desfruta de relações íntimas
– Tem pouco interesse por experiências sexuais
– Não sente prazer com quase nada
– Não tem amigos próximos
– Mostra-se indiferente a elogios ou a críticas
– Demonstra frieza emocional
2. Esquizotípico
– Tem comportamento e aparência extravagantes
– Sente que tem experiências perceptivas incomuns
– Acha que pode prever coisas
– É muito ansioso socialmente (na presença de outras pessoas)
– Mantém crenças estranhas ou pensamentos mágicos (superstição exagerada)
– Mostra desconfiança paranoide
– Demonstra afeto inadequado
– Não tem amigos próximos
3. Paranoide
– Suspeita, sem embasamento, de estar sendo explorado ou enganado
– Tem preocupação injustificada com a lealdade de amigos
– É incapaz de confiar nas pessoas
– Percebe significados ocultos em qualquer situação
– Guarda rancores
– Acredita sofrer ataques a sua reputação que não são percebidos pelos demais
– Tem dúvidas constantes sobre a fidelidade do parceiro.
4. Antissocial
– Tende à falsidade
– Não consegue se ajustar às normas sociais
– Apresenta irritabilidade ou agressividade
– É incapaz de planejar o futuro
– Tem descaso com a própria segurança ou com a segurança alheia
– Demonstra irresponsabilidade reiterada
– Não sente remorsos
– É sedutor e manipulador
5. Bordeline
– Tem mudanças rápidas de humor
– Teme ser deixado e quer evitar o abandono desesperadamente
– Mantém relacionamentos intensos e instáveis
– É impulsivo em compras, no abuso de álcool e drogas e na prática de sexo sem proteção
– Tem recorrente comportamento suicida ou automutilante
– É instável afetivamente e sente um vazio crônico
– Tem pensamentos paranoides em momentos de estresse
6. Narcisismo
– Mantém fantasias de sucesso ilimitado na vida
– Acredita ser alguém único e especial
– Necessita excessivamente de atenção
– Tem certeza de possuir direitos exclusivos
– Carece de empatia
– Tende a ser explorador nas relações
– É arrogante e insolente
– É propenso a ter inveja e se sentir alvo de inveja
7. Histriônicos
– Fica desconfortável quando não é o centro das atenções
– Tem comportamento sexualmente sedutor e exagerado
– Apresenta mudanças emocionais rápidas
– Faz discursos grandiloquentes mas carente de detalhes
– Dramatiza as emoções
– Usa excessivamente a aparência física para atrair olhares
– Acredita que as relações pessoais são mais íntimas do que, de fato, são
8. Dependente
– Busca urgentemente outro parceiro após o término de uma relação
– Tem dificuldade para tomar decisões sem aconselhamento excessivo
– Terceiriza a responsabilidade sobre a própria vida a outras pessoas
– Raramente manifesta desacordo, para não perder apoio
– Não tem iniciativa para fazer coisas por conta própria
– Vai a extremos para obter carinho e amparo
– Sente-se desconfortável quando sozinho
– Tem medo irreal de ser abandonado
9. Evitativo
– Evita trabalhos que exijam muito contato interpessoal
– Não se envolve com outros sem a certeza de que será bem recebido
– É reservado nos relacionamentos íntimos, por vergonha ou medo do ridículo
– Preocupa-se com críticas e rejeições
– Fica inibido para conhecer gente nova, por se sentir inadequado
– Acredita ser inferior aos demais, sem atrativos
– Reluta sem assumir riscos ou fazer coisas novas
10. Obsessivo-compulsivo
– Preocupa-se muito com regras, organização e horários
– Apresenta perfeccionismo e teimosia
– Tende a preferir o trabalho ao lazer
– É inflexível e escrupuloso em relação à moral e à ética
– Não gosta de descartar objetos usados, mesmo quando inúteis
– Reluta em delegar tarefas ou trabalhar em equipe
– Tem preocupação exagerada em poupar, o que pode levar à sovinice
Para que determinados traços de personalidade tipifiquem um transtorno, é preciso que a pessoa apresente comportamentos danosos repetidamente (ou seja, não apenas em uma época) desde o fim da adolescência ou o início da vida adulta. É nessa fase que tais distúrbios costumam aparecer.
— A prevalência de transtornos de personalidade na população mundial é de 10%. A mera presença de uma característica (típica de um problema psíquico), sem trazer tantos prejuízos, não define a doença — esclarece a médica.
Para o psiquiatra Gabriel Bessa, do Hospital Estadual Pedro II, a melhor forma de se proteger de "psicopatas do cotidiano" e se poupar de sofrimento nas relações é identificar seus próprios limites.
Não há como mudar os outros. Então, o que cada um pode fazer para melhorar o convívio é conhecer a si mesmo. Quando o relacionamento com o eu está bem cuidado, a pessoa fica menos vulnerável para ser manipulada — ressalta.
Outras medidas importantes são não tomar como pessoais as atitudes de quem apresenta alguma psicopatia e evitar confrontos desnecessários.
Existe tratamento para esses transtornos, mas ele só é eficaz se o paciente admite o problema. Em geral, ele busca ajuda apenas se houver distúrbios associados, como depressão e ansiedade — diz Katia.
Fonte: Fãs da Psicanálise