Para que a criatividade flua livremente e novas ideias apareçam, é preciso eliminar velhos conceitos e outros sedimentos pessoais. Muitos desses conceitos estão enraizados dentro de nós, e insistem em lá permanecer.

Uma calha sob as telhas pode estar entupida de insetos, folhas mortas, gravetos e outras coisas mais e, se chover, a água, em vez de fluir, transbordará e poderá provocar alagamento. Acontece o mesmo com a criatividade: para que ela flua livremente e novas ideias apareçam, é preciso eliminar velhos conceitos e outros sedimentos pessoais. A simples consciência desses bloqueios já ajuda a eliminar muitos deles, mas existem outros, mais complicados, que estão enraizados dentro de nós, que insistem em lá permanecer, quase sempre sem percebermos isso, dificultando consideravelmente ações criativas pessoais, profissionais e organizacionais.

Veja os oito maiores bloqueadores da criatividade:

Raciocínio lógico. Objetividade.

A lógica é importante – e sempre será – em muitos momentos da nossa vida pessoal e profissional. Contudo ela também pode ser um enorme bloqueador da criatividade. Sempre que quisermos resolver imediatamente as coisas e formular definições rápidas de um problema, estamos inibindo e impedindo a visão criativa de agir. Frases do tipo, "Isso não tem lógica", "Sejamos objetivos", "Vamos ser práticos", tolhem consideravelmente soluções originais, diferenciadas e criativas. A lógica além de importante é necessária, e tem seu momento na arte criativa, mas, na fase final do processo.

Acomodação. Passividade.

Muitas pessoas acreditam que para acionar a criatividade basta ficar tranquilo, sentar numa poltrona, ficar relaxado, que as ideias criativas vão aparecendo uma após outra; basta ficar passivo e receptivo que as coisas vão automaticamente acontecer. Este é um conceito totalmente equivocado sobre criatividade e inovação. A inspiração criativa pode até surgir num momento inesperado ou através de um imprevisto, mas, se assim aconteceu, é porque foi fruto de considerável trabalho anterior, através de esforços contínuos e conscientes. Depois que surge a ideia, é preciso concretizá-la e isso exige considerável esforço e dedicação.

Medo de crítica.

Como criatividade lida com coisas inovadoras e, por vezes, representa uma ameaça ao tradicionalmente aceito, pessoas que se mostram sensíveis às críticas podem sentir-se inibidas ao apresentarem novas ideias e conceitos perante a sociedade ou colegas. Expressões de cinismo, dúvida, crítica ou indiferença por parte das pessoas acontecem frequentemente quando alguém tenta colocar em prática algo inovador e diferenciado. Santos Dumont foi alvo de muitas críticas e chacotas antes de voar com o 14 Bis, porém isso não o impediu de seguir em frente e ver sua ideia triunfar.

Ameaça à segurança e ao status.

Há pessoas que sentem-se extremamente inseguras quando têm que implantar novas ideias, processos ou estruturas, por estarem arraigadas ao passado e, não raro, bloqueiam mudanças por medo de serem prejudicadas. Resistem a novas ideias e a tudo que possa significar ameaça ao que já conquistaram. Os primeiros automóveis foram recebidos como coisa do capeta pela Sociedade Inglesa pelo Progresso da Ciência, enquanto que a imprensa, inventada por Gutenberg, enfrentou acirrada oposição dos calígrafos e copistas da época, receosos de perderem seus empregos.

Falta de autodisciplina. Falta de perseverança.

A ausência de um esforço contínuo e bem orientado é uma grande barreira à criatividade. Pessoas que não tem autodisciplina costumam ser inconstantes e até desmotivadas, porque seus esforços aparentemente não são recompensados, ou porque divagam muito. Então desanimam antes de alcançar os primeiros resultados. Leos Janacek, consagrado compositor checo de música erudita, só obteve reconhecimento de suas composições nas grandes salas de concerto da Europa, quando já era sexagenário. Desde então, até seu falecimento aos 74 anos, ele compôs grande quantidade de peças clássicas surpreendentemente modernas e inovadoras, tidas como verdadeiras obras-primas.

Apego a normas e padrões.

Normas e padrões são úteis e necessários para estabelecer desempenhos, procedimentos e comportamentos. Mas podem tornar-se um amargo veneno quando bitolam e cerceiam a criatividade. Muitas normas e padrões são obsoletos, mas a tradição (ou insegurança das pessoas) insiste em mantê-los. Há, também, normas e procedimentos que ainda têm alguma utilidade, mas impedem que novos e mais atuantes processos e ideias possam operar, obstruindo o surgimento de ações inovadoras.

Paradigmas e pressupostos rígidos.

Criatividade é especialmente útil na quebra de paradigmas, quando indaga seus pressupostos. São aquelas atitudes e valores fortemente arraigados que fazem parte de nosso dia a dia no trabalho, na família, nos relacionamentos, na nossa maneira de agir. A exemplo das normas e padrões, paradigmas são necessários quando nos ajudam a entender e orientar as ações do cotidiano e facilitam o cumprimento das nossas atividades. Tornam-se, no entanto, um grande bloqueador quando nos enfiam dentro de uma caixa e nos fazem perder a visão da realidade ou de possibilidades mais criativas e benéficas. Não é de estranhar que o laptop não foi inventado pela IBM, o relógio de quartzo não foi inventado pelos relojoeiros, e a fotocópia não foi inventada pela Xerox. Eles estavam ofuscados por seus bem-sucedidos paradigmas e não enxergaram além dos próprios limites.

Presunção. Falta de humildade.

A presunção é um mal que prejudica e, até mesmo, anula o discernimento e percepção das coisas. Pessoas que sofrem desse mal ficam cegas às novas ideias, inventos e possibilidades por excesso de orgulho ou amor-próprio. Todos estamos sujeitos a isso, até mesmo inconscientemente, quando achamos que o que sabemos é suficiente para os nossos propósitos. Pessoas renomadas são, frequentemente, vítimas de presunção. No livro Qualidade da Criatividade, de Victor Mirshawka, há uma relação de frases pronunciadas por respeitáveis autoridades mundiais sobre algumas descobertas e inventos, mostrando que o ser humano é naturalmente refratário ao que é novo e distinto dos padrões habituais. Veja algumas das frases.

A teoria dos germes de Louis Pasteur é uma ridícula ficção.
Pierre Pochet, Professor de Fisiologia em Toulouse, 1872

É totalmente impossível que os nobres órgãos da fala humana sejam substituídos por um insensível e ignóbil metal. Jean Boillaud, da Academia Francesa de Ciências, sobre o fonógrafo de Thomas Edison, 1878.

Quando a exposição de Paris se encerrar, ninguém mais ouvirá falar em luz elétrica. Erasmus Wilson, da Universidade de Oxford, 1879.

O cinema será encarado por algum tempo como uma curiosidade científica, mas não tem futuro comercial. Auguste Lumière, a respeito do seu próprio invento, 1895.

Tudo que podia ser inventado já foi inventado. Charles Duell, diretor do Escritório de Patentes dos Estados Unidos, 1899.

O Raio-X é uma mistificação. Lord Kelvin, físico e presidente da Real Sociedade Britânica de Ciências, 1900. O avião é um invento interessante, mas não vejo nele qualquer utilidade militar.
Marechal Ferdinand Foch, da Escola Superior de Guerra da França, 1911.

Não há nenhuma probabilidade de que o homem venha algum dia a controlar a energia do átomo. Robert Millikan, Prêmio Nobel de Física de 1923.

O cinema sonoro é uma novidade que durará somente uma temporada. Revista Americana Cinematographer, 1930.

Creio que no mundo existe mercado para apenas uns cinco computadores. Thomas J. Watson, presidente da IBM, 1943.

Não há qualquer razão para as pessoas terem um computador em casa. Ken Olsen, presidente da Digital Equipment Corporation, 1977.

Texto extraído e condensado do livro "Manual de Criatividade Aplicada", de Ernesto Artur Berg, Juruá Editora.

Imagem: PsicoBlog

Fonte: PsicoBlog