A hifefilia é a denominação adotada no meio clínico e acadêmico para explicar o desejo, excitação, preferência ou prazer relativos a tecidos variados. É uma sensação boa ao sentir o cheiro de um casaco novo de couro ou ao passar a mão no lençol de cetim. Látex, cetim, couro e outros tecidos fazem parte desse fetiche, no qual, muitas pessoas são uma conotação sexual a essa percepção.


Esse significado erótico para alguns tecidos vem das vivências táteis, olfativas ou visuais percebidas como excitantes para os adeptos do fetiche, sendo a sua grande maioria os homens. Segundo o psicólogo Marcos Santos, especialista em sexualidade, as teorias mais conhecidas a respeito desse tema são baseadas nos estudos do psicanalista Sigmund Freud. "Mas isso não quer dizer que mulheres não os possuam. Elas foram reprimidas ao longo da História pelos homens e, em consequência, não desenvolveram os mesmos fetiches em igual proporção", esclarece Marcos.


Já o psiquiatra Carlos Eduardo Carrion, também especializado em sexualidade, tem sua visão sobre o assunto conforme suas experiências em consultório. De acordo com ele, os homens geralmente têm mais fetiches provavelmente pela insegurança de conseguir ou não uma boa ereção e/ou ainda por conta do medo de não satisfazer a parceira. "Alguns atribuem o gosto por fetiches à maior carga de testosterona, que levaria a um aumento dos impulsos e, com esses, à uma maior necessidade de resultados imediatos", explica.

O especialista também diz que várias escolhas de objetos ou de situações que o envolvam podem ter relação com vivências, lembranças ou até mesmo falsas memórias atribuídas a um prazer sexual maior. "Para ser considerado fetiche, é preciso que o material seja usado repetidamente e com a finalidade de obter satisfação com a prática", afirma Carrion.

Além disso, esse prazer por certos tecidos pode começar na infância mesmo que de modo inconsciente. "Em alguns casos é provável que exista um contexto nos primeiros anos de vida da pessoa em que um tecido especial se associe ao comportamento da mãe e que seja compreendido e memorizado como prazeroso ou associado a sentimentos sexuais. Muitas vezes o couro é associado a vivências infantis junto a circunstâncias, aparentemente não sexuais, como andar a cavalo", conta o terapeuta sexual Oswaldo Martins Rodrigues Jr.


Marcos, volta aos estudos de Freud novamente e diz que alguns fetiches envolvem partes do corpo ou vestuário da mãe e se relacionam com a desconexão-superação do vínculo infantil mãe-filho, além de proibições e regras transmitidas em cada fase. Exemplos: fim da etapa do colo, amamentação, mimos, repressão da nudez, experiência com o primeiro cobertor, entre outras. "O importante é reconhecermos que o ser humano tem a capacidade de fantasiar situações eróticas sem nenhum tipo de restrição em pensamento em qualquer fase da vida, o que facilita algumas associações com objetos ao longo da vida sexual", afirma.


De uniforme de guerra a livro de Madonna


Dentre os materiais do universo BDSM (bondage, disciplina, dominação, submissão e sadomasoquismo), o couro e o látex estão entre eles, e essa ligação, segundo Oswaldo, vem dos tempos de guerra. Um dos motivos é o uso desses materiais na fabricação de botas ou equipamentos de proteção. "Ao mesmo tempo, os locais de diversão nas guerras eram as boates e os bordéis, nos quais as roupas relacionadas ao erotismo levavam cetim, o substituto mais barato da seda. Em situações de maior medo e necessidades de comportamentos de fuga, novos e inusitados materiais ganharam a conexão com o sexo, uma vez que este traz relaxamento e calma, contrastando com as emoções exigidas no enfrentamento de situações difíceis", explica.


Já os países que não sofreram com os conflitos em épocas de guerra, essas práticas se disseminaram por transmissão cultural, pelas histórias contadas e por imagens como filmes ou vídeos, explicando o que deve ser usado para a erotização. "É por isso que nem todos os estudiosos concordam com o surgimento de um fetiche na infância. O apelo sexual e a sensualização de certos tecidos e roupas foi trabalhada e divulgada culturalmente como eróticos. Um bom exemplo é o da Mulher Gato, cuja imagem vestida de couro ou de látex se fixou no imaginário popular como uma mulher dominadora e sexy", esclarece Arlete Girello Gavranic, terapeuta sexual.


Dessa maneira, as sensações podem ser associadas ao histórico de aprendizados, simbolismos culturais, assim como a uma descoberta tardia de gosto ou desejo sexual estimulado por filmes, novas e revistas. A moda, mesclando apropriação e encorajamento, também teve um papel fundamental na propagação dos fetiches por determinados tecidos, principalmente por meio de criações de estilistas como Thierry Mugler, Gianni Versace e Jean-Paul Gaultier entre os anos 70 e 90. A cantora popstar Madonna, ao lançar seu célebre livro "Sex", em 1992, com fotos de Steven Meisel, também aguçou ainda mais a curiosidade das massas sobre os fetiches envolvendo couro, renda, seda, látex e afins.

Como é no sexo?


A excitação por tocar tecidos ou peças de roupa feitas de alguns materiais é da ordem subjetiva de cada fetichista, independentemente de ser desejo consciente o não. De forma geral, há uma preferência por algo particular e exclusivo, seja relacionado a sensações sutis como da lã e da seda, seja relacionado a sensações intensas de contato como látex, vinil e couro.


Normalmente, as pessoas adeptas da hifefilia gostam de usar ou querem que o (a) parceiro (a) use roupas feitas do material para que o sexo aconteça e satisfaça por completo. "Para alguns praticantes, o ideal são aquelas roupas que cobrem o corpo todo, apenas com aberturas nos genitais. É comum encontrarmos esse fetiche relacionado com outros e também com algumas práticas. A hifefilia faz parte, por exemplo, do universo BDSM, principalmente no que diz respeito à parte de bondage, em que um dos dois do casal pode ser amarrado com lã ou enquanto usa trajes feitos do material de sua preferência. Essa pode ser outra forma de iniciar o sexo tendo atendidas suas necessidades de sentir o tipo de material que mais gera estimulação", pontua Marcos.


O cheiro e o toque dos materiais podem ser suficientes para causar excitação, ou seja, experiências a sós também fazem parte do fetiche. Além da aproximação e do contato direto com a própria pele, o fetichista normalmente pede para que o parceiro use o objeto durante as relações ou pode ter uma relação especial com tal item, como se masturbar enquanto o segura, esfregá-lo ou cheirá-lo. São diferentes formas então de se excitar e de alcançar satisfação sexual.

Segundo Marcos, a concepção de que o fetiche possa gerar algum problema na vida da pessoa geralmente se associa às limitações ou dificuldades reconhecidas pela própria pessoa ou sua parceria. Na prática, o objeto do fetiche existe para acabar com uma angústia e ou atender a um desejo. "O fetiche pode ser problemático quando ele deixa de ser uma fantasia ou preferência sexual e passa a ser a única forma da pessoa sentir prazer. Nesse último caso, é possível ter dificuldade para manter um relacionamento afetivo-sexual de longo prazo com outra pessoa que não apresente essa característica. O importante é que toda atividade sexual, com ou sem objetos, seja realizada com consentimento e entre adultos e possa ser uma grande fonte de prazer e satisfação pessoal", explica o psicólogo.


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Fonte: Universa

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